Crônica de José Maciel – Jornal A Verdade 10/09/1972. O velho Torrão.
O Capitão Antonio Pinheiro Castelo Branco, um cidadão idoso, alto, forte, de cabelos brancos e uma barbicha despontada a modo de pêra, morava na Rua do comércio e era vizinho do comerciante português Joaquim da Costa Braga, com quem se aparentava, não sei por que vias.
Morando em vasto casarão, estava constantemente sentado num ângulo da pequena ante-sala onde, durante toda a minha infância, ao passar por ali, via-o sempre com um enorme lenço vermelho removendo o nariz, em mio a espirros estridentes, o rapé que sorvia em quantidade considerável, certamente para prevenir a pituitá.
O posto de Capitão deve ter vindo da Guarda Nacional, mas não sei ao certo, pois ao tempo, a gente simples costumava atribuir aos mais velhos e arranjados patentes que variavam segundo a idade.
Como quer que seja, o Capitão Antonio Pinheiro Castelo Branco, sem arredar pé da casa, era conhecidíssimo na cidade, e até me lembro de particularidades, como por exemplo, da camisa e calças brancas bem como dos chinelos de marroquim escuro e meias brancas que compunham o traje invariável desse ilustre baturiteense a quem nunca vi senão na quase deserta ante-sala do velho solar onde sob seus passos, mesmos prudentes, as taboas carcomidas do assoalho gingavam com um ruído abafado.
No quarteirão, aliás o mais apresentável da tradicionalidade, vivia desde dezenas de anos, um púgilo de cidadãos representantes de linhagens respeitáveis tais como, Bragas, Falcões, Matos Mácieis, Motas, Albuquerques, Leais, Paivas, Pintos e outros .
Baturité era, então, essa gente, esses patriarcas que, somados a muitos outros seria longo e fastidioso descrever. Muitos desses antepassados acostumados, de boa vontade, à conjuntura criada pelo natural envolver do tempo, aderiram ao surto migratório que levou para a Capital do Estado uma considerável parcela da população, de modo que, dentro de uma década, a cidade viu renovado o seu elemento humano.
É de crer que tenha acontecido o mesmo por todos os recantos do norte, de vez que o fim da segunda guerra significou não só para nós, mas para o mundo inteiro, a renovação das coisas, do tempo, dos homens, da vida enfim.
Voltando, porém, a Antonio Pinheiro Castelo Branco, cabe explicar que foi objeto desta Crônica simplesmente por causa da minha longínqua preocupação com tão vistoso lenço vermelho, com aquela barba branca a Washington Luiz, com os espirros barulhentos, com aquelas chinelas de marroquim, enfim com a sua estranha figura de cidadão respeitável e eminentemente conservador.
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