Raimundo Raul Correia Lima
29 de dezembro de 2011
Nos últimos anos da ditadura de Getulio Vargas, a 21 de fevereiro de 1944, chegou nomeado prefeito de Baturité, pelo então governador em exercício Dr. Andrade Furtado, o crateusense Sr. Raimundo Raul Correia Lima, trazendo consigo o currículo político com a experiência de ter sido, anteriormente, prefeito, também nomeado, de Aurora e Icó.
Homem modesto, de parcos recursos, para poder se mudar, foi-lhe concedido pelo estado o custeio do transporte da família, inclusive de suas vacas preparadas para embarque na estação de José de Alencar. As vacas serviam para fornecer leite os filhos pequenos.
Chegado a Baturité com a esposa e dois filhos – José e Ana Zélia – o prefeito hospedou-se no Hotel Canuto, isso porque não gozou do privilégio de morar na residência destinada aos prefeitos, porquanto sua nomeação não agradava ao manda-chuva Ananias Arruda dono da aludida casa.
A prefeitura Raimundo Correia recebeu das mãos do professor Tito, moço muito estimado, motivo porque, até, temeu desagradar aos munícipes a quem o antecessor muito aprouvera, contudo, munido de experiência, o novo mandatário enfrenta de cabeça erguida o desafio.
Dos funcionários imediatos, Joel Furtado, José Furtado, Lica e dona Stela, esta, logo deixou a secretaria, talvez, por fidelidade ao coronal Ananias. Efetivos, os outros, de maneira profissional, principalmente diante da regulamentação de carreira que passou a remunerá-los e promovê-los de acordo com a capacidade de cada um, mostraram-se satisfeitos, ainda mais, no dia em que todos os cinqüenta, receberam os dez meses atrasados pelos antecessores, isso, mediante festa com cerveja, banda de música e espocar de foguetes sob as expensas do município. Da qualidade dos funcionários Raimundo Correia louva-se de ter nomeado secretária-tesoureira a Antonieta Alencar, moça inteligente e operosa administrativamente, ao mesmo tempo traça elogios ao Bertulino, de quem acabou compadre e seu Costa, bom eletricista, a Vicente Gregório, subprefeito de Capistrano, trazido de Aurora, de Raimundo Cosme e do Braulino responsável pela limpeza das ruas usando carrinhos de mão e uma carroça.
Naquele tempo, verdadeira apoteose, organizado por Ananias Arruda, acontecia o Primeiro Congresso Eucarístico, fazendo vibrar a cidade, mergulhada em estado de graça, de tal modo que, da população, quem não sabia cantar pelo menos lhe assoviava o hino.
Vendo-se excluído, mas forçado por Andrade Furtado, o prefeito não pôde ficar indiferente diante do acontecimento, porquanto, mandou limpar a cidade providenciou iluminação mais eficiente, estimulou a população a pintar a fachada das casas, colocou o carro da prefeitura à disposição do congresso, mandou melhorar a banda de música, muito embora o Sr. Ananias já tivesse conseguido outra em melhor condição. Na estação do trem, junto às autoridades Dr. Germiniano Jurema, Juiz de Direito, Dr. José Rolim da Nóbrega, Promotor Público, e o Sr. Pedro Silvino, Delegado de Polícia, como Prefeito Municipal recepcionou Bispos, Padres e Seminaristas convidados e, no mais os saudou-os, em discurso, no qual lhes entregava a chave da cidade.
Da lavra de Raimundo Correia, o livro “MINHA HISTÓRIA, TRABALHO, RECORDAÇÕES E PECADO, na parte dedicada a Baturité, mostra quão foi atribulada sua primeira administração, principalmente, pelo perfilhamento versus ao prestigioso Comendador. Das futricas políticas o livro destaca aquelas que o próprio prefeito executava em desfeita ao prestigioso coronel, a saber:
Achou de mandar, como realmente mandou transferir o sargento Delegado da Cidade que, por ordem do comendador, quis suspender, sem sucesso, uma festa na casa do Juiz;
Mandou podar uns fícus benjamins. Daí, acusado de destruir a arborização, acusado pelo Comendador, foi intimado a “justificar a inépcia” junto ao governador.
Acusado de não praticar a religião católica, foi argüido, pelo próprio Governador Pimentel;
Desagradou o Comendador ao facilitar que certo senhor Galvão, exibisse na prefeitura uma peça teatral já proibida por aquele;
Cedeu salão na prefeitura ao poder judiciário hostilizado pelos antecessores.
Prolongou a iluminação elétrica até o Hotel Canuto, para em conseqüência beneficiar a casa do Juiz às escuras por questões políticas;
Finalmente, acabou com o tabu que não permitia que se dançasse nos salões da prefeitura.
Da vida particular Raimundo Correia conta passagens inesquecíveis: nascimento, a 29 de maio de 1945, do quarto filho Francisco; outra ao morar no Sobrado dos Maciéis quando curou a coqueluche dos filhos com tangerina e jejum; outras ao se mudar para a antiga residência do José Pinto do Carmo, foi surpreendido por um incêndio, em seguida debelado por amigos; ainda naquela casa teve um empregado preto de nome Luiz que comprava carnes em seu nome e uma empregada que matou um peru tentando curá-lo de uma doença com água e cal; no quintal da mesma casa possuía uma engorda de porcos para venda.
Da dívida pública herdada, maiores que dois orçamentos, estas foram pagas com muito sacrifício mesmo não devidamente reconhecidas. Das outras realizações ao cortar verbas que oneravam a prefeitura, melhorou a, sempre precária, iluminação pública; instalou no sítio da prefeitura, antiga casa de Pedro Catão um campo de demonstração agrícola e venda de mudas enxertadas; tirou dos pobres necessitados a obrigação de pagar uma dívida ativa que lhes impuseram os antecessores.
Em maio de 1945. Com todo Baturité comemorando a queda de Berlim, com muita festa e o comércio totalmente fechado, a frente de tudo e de todos Raimundo Correia, partidário do acontecimento, não obstante o seu grande conceito na cidade foi demitido da prefeitura sem aviso prévio.
Certificado de que Andrade Furtado referendou sua demissão levado por Ananias Arruda, passou a prefeitura para Edmundo Bastos e, logo em seguida, mudou-se para Fortaleza, isso, com a ajuda da maçonaria e de alguns amigos, pois, na ocasião lhe faltava, até, o dinheiro para o transporte.
Pasmem os de hoje diante da honestidade dos de ontem.
Mário Mendes Junior.
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